segunda-feira, 23 de maio de 2016

ABANDONADO: nem livre, nem igual

Marcos Antonio Dantas de Oliveira

É no locus da política que se debate o controle dos recursos naturais, dos tributos  e das políticas públicas [distributivas, redistributivas, reguladoras]; as incertezas social e econômica; as liberdades fundamentais; os negócios privados e os públicos, individuais e coletivos; os princípios da Administração pública; o bem-estar pelo usufruto dos bens primários propostos por John Rawls [Uma Teoria de Justiça]: autoestima, inteligência, imaginação, saúde e vigor, oportunidades, renda, riqueza, liberdades, direitos como cidadãos iguais e livres. 

É o planejamento [o pensar e o agir], o instrumento [de ações, orçamentos, fiscalizações] que visa não só o conforto material, mas, o bem-estar, no presente e no futuro, para além das ideologias. Portanto, é estratégico promover o Desenvolvimento Sustentável fundamentado na problematização dos conflitos, da gestão, da governança, da governabilidade e da justiça social. E esse debate tímido não consegue sair dos gabinetes, nas cidades pequenas e zonas rurais nem abstração é. Por isso, o Estado continua sem um projeto de desenvolvimento para minimizar, superar ou erradicar a privação das capacidades básicas de muitos indivíduos em contraponto ao excesso de bens primários propostos por Rawls de uns poucos brasileiros, de 1% da população mundial, longe da argumentação sobre carência e excesso do filósofo Aristóteles.

Não obstante, o agricultor familiar, o beneficiário da Lei 11.326/2006, principalmente, o jovem rural necessitam participar de escolhas e decisões, que diz respeito a sua posição na distribuição e usufruto dos bens primários propostos por Rawls; esse exercício de liberdades fundamentais assegurará, por exemplo, seu acesso e uso ao financiamento, à inovação, à seguridade social cumprindo os critérios e graus de exigência para que a atividade produtiva cumpra sua função social [Art.186 da Constituição Federal]; porquanto sustentar sua lógica familiar [terra, trabalho e família] é conquistar posições sociais confortáveis ao exercitar os princípios da Administração pública. E entre outras disposições sociais, assegurar um serviço eficiente de pesquisa e Ater é básico e relevante no Brasil.

No entanto, o serviço ineficiente da EMATER/AL ocorre, principalmente, pela opção governamental e pela apatia dos agricultores familiares e da sociedade, esses fatos só fazem aumentar as incertezas quanto à reprodução de seus negócios e à pobreza em suas vidas – resta-lhes a penitência como conforto terreno. O governo de Alagoas insiste em aniquilar qualquer debate em torno da agricultura familiar, como exemplo, a distribuição sementes de grãos para o cultivo, de 2012 para cá. O IBGE confirma a elevada perda de produção de grãos pela seca persistente; e há também uma perda para a sociedade, algo em torno de 50 milhões de reais na aquisição de sementes nesse período, mas o governo continua comprando-as para doá-las aos que fazem a agricultura familiar. 

E  o mais grave, o que colheu é de baixa qualidade; e sem safra de qualidade gerou uma crescente dívida social, pois, o agricultor familiar quando da utilização do seu trabalho familiar sem remuneração e do trabalho infantil só fazem crescer sua miséria, empobrece-o ainda mais. De modo que, o desperdício do dinheiro público [FECOEP] e da mais-valia do agricultor não é surreal; é uma brutal transferência de renda para a indústria, o comércio, o banco e o Estado, que inviabiliza até os empregos ilegais em maioria na atividade agrícola.

O Estado utiliza de novo os recursos do FECOEP, algo em torno de R$ 12 milhões para adquirir sementes de grãos. E o governador distribui 20 mil kg de sementes para 1.500 famílias; vale acrescentar que 94 mil famílias receberam sementes no estado. É surreal que cada agricultor receba 13 kg de sementes de grãos, e o governador sinalize que esses agricultores ajudaram a elevar a produção comercial do estado para 100 mil toneladas de milho – “Com a ajuda dessas sementes distribuídas, nesta sexta-feira, vamos produzir 100 mil toneladas de milho em Alagoas. Precisamos ir além e dar as condições ao agricultor e ao agronegócio”, completou Renan Filho em Piranhas, dia 16, próximo passado.

E mais: o Estado não comprou até agora nada do agricultor familiar pelo PNAE [Lei dos 30%] – programa da merenda escolar – “Os técnicos do PNAE e do FNDE que participam do encontro disseram que o estado está descumprindo a legislação por falta de vontade política, por falta de interesse”, comenta João dos Santos, presidente da Unicafes/AL [Gazeta de Alagoas/Rural,13/05/2016]; que, inclusive já tinha pedido apoio do Ministério Público Federal/MPF para cobrar do governo o cumprimento da Lei dos 30% em reunião com representantes do setor: Cooperagro, Fetag, CPLA, Cooperativa Pindorama, entre outros, em 25/01/2016.

Outro agravante relevante: as condições edafoclimáticas não são propícias ao cultivo, face a severidade do El Nino – com chuvas abaixo da média nos meses de maio e junho [http://msne.funceme.br/ e http://www.climatempo.com.br/brasil]. Mais outro: o desmonte do setor agrícola estatal, também, pelas aposentadorias; bem como, há mais 30 anos sem fazer concurso público. Apesar desses agravantes, parece que o Estado de Alagoas não tem técnicos capazes de interpretar os informes e dados climáticos e recomendar boas práticas aos agricultores para essa e outras situações. Que Estado é esse?

O Estado brasileiro também precariza o trabalho do profissional das ciências agrárias, humanas entre outras, um verdadeiro atentado à dignidade da pessoa; esse fato acontece em Alagoas, pois, o governo do Estado continua demitindo gente especializada da Carhp à disposição da Emater, profissionais aptos para o atendimento aos agricultores familiares. Outro agravante: deslocou da Carhp esses recursos salariais para a contratação de professores da Universidade Estadual de Alagoas/Uneal. Contudo, para atender os agricultores familiares preferiu usar o termo de outorga e contratar 97 bolsitas para atuarem pela Emater alegando fortalecimento desse serviço; aliás, esses bolsitas são impedidos de atuarem como profissionais – não podem assinar projetos, Declaração de Aptidão do Produtor/DAP, receituário agronômico e veterinário entre outros serviços por não estarem em conformidade com a ética de seus Conselhos: CREA e CRMV, e perante o manual do servidor não podem dirigir veículos. 

Governador contratar bolsitas é uma atitude desrespeitosa com os profissionais, com os agricultores familiares, com a sociedade, pois precariza e encarece o serviço de pesquisa agrícola e extensão rural. Por que não usou esses recursos para contratar profissionais [fazer concurso público] para a Emater?
                                                                                                                  
É uma retórica frágil, pois as condições reinantes nos órgãos estatais são de penúria, por exemplo: face à carência de recursos financeiros a frota de veículos da EMATER está em estado de mal à regular de conservação, há tempo sem manutenção, e com uma ridícula cota de combustível para realizar o serviço de pesquisa e Ater, inclusive levantar seu patrimônio; alguns veículos com documentação atrasada e alguns outros cedidos para terceiros privados, descumprindo os convênios existentes; com escritórios fechados e alguns em mau estado de conservação e com parcerias precárias com algumas prefeituras completam o diagnóstico de penúria dessa instituição.

Não obstante, contextualizando esse diagnóstico observa-se, o predomínio de uma retórica surreal brasileira sem nenhum alcance para alavancar o bem-estar da maioria dos agricultores familiares das classes D e E; pois, até o índice de Mal-estar [a soma das taxas de inflação e de desemprego] da população da classe C é hoje 40% maior do que o da média brasileira [Exame, 25/05/16] -  http://oglobo.globo.com/economia/escalada-do-desemprego-da-inflacao-castiga-os-brasileiros-revela-indice-19225538; e confirmá-la-ia, por exemplo, na fala do governador de Alagoas: "dar condições ao produtor para produzir, escoar e vender, gerando renda" para os agricultores familiares; e continua equivocado nessa outra afirmativa: “desde o início do governo falei que não admitia que nosso Estado não tivesse assistência técnica”[Gazeta de Alagoas/Rural, 11/03/2016]. Governador, bolsita não faz, nem fará a Emater realiza sua finalidade:  atuar como um serviço de educação não formal, de caráter continuado, no meio rural, que promove processos de gestão, produção, beneficiamento e comercialização das atividades e dos serviços agropecuários e não agropecuários, inclusive das atividades agroextrativistas, florestais e artesanais.

Governador, o estado continua oferecendo um serviço de pesquisa e de extensão rural ineficiente e caro, aos agricultores familiares e à sociedade, e sem nenhum alcance para alavancar o bem-estar dos agricultores familiares - quão surreal é o governo!

Entrementes, os governos gastam uma fortuna sem nenhuma razoabilidade em mídias inusitadas e surreais, um acinte ao bem-estar – um despautério. Ademais, Alagoas ao completar 200 anos de emancipação política, em 2017, continuará com má distribuição de bens, serviços e benefícios para a grande maioria da população e dos agricultores familiares, dos beneficiários da Lei 11.326/2006, principalmente, das crianças e dos adolescentes? Ou serão cidadãos iguais e livres? Qual será a boa nova?