domingo, 23 de dezembro de 2012

Para além do NATAL

Marcos Antonio Dantas de Oliveira

Solape os pecados capitais [gula, inveja, preguiça, ira, soberba, avareza, luxúria], o egoísmo – “Mendicância cresce em período natalino” [1]. E erradicá-los: é protagonizar, é cooperar, é ajudar a promover convicções, responsabilidades e estratégias que garantam a reciprocidade como fator indivisível para o desenvolvimento das pessoas e das comunidades.

Celebre a vida! Este objetivo é alcançado se sustentado pelo sentimento de pertencimento a um lugar – como os povos da floresta; pelo sentimento existencial – como a mãe que amamenta sua filha; pelo sentimento de solidariedade – por laços afetivos; e pelo sentimento de cooperação – por ajuda mútua nas relações sociais.

Esses sentimentos são encontrados com intensidade e riqueza na vida rural dos povos e comunidades tradicionais, dos agricultores e extrativistas familiares, e de outros rurícolas que [re]construindo esses ambientes, ora de aproximação com as pessoas, fazem-nas reviver em si. Daí a origem e a opulência do caráter emancipador, conservador e utópico dessas categorias em sustentar e satisfazer-se em seu labor, em sua ação para demandar os prazeres materiais, culturais, lúdicos e espirituais. Nas comunidades rurais, o Natal é comemorado com rituais próprios, que dão uma conotação vigorosa aos seus modos de vida, assim pressupõe a existência de relações sociais [e religiosas com fervor] e ecológicas [com a natureza e seus mitos] intra e intergeracional.

Esse modo de vida não é somente uma ação normativa em si; é um estado de [da] vida. É renovado pelo diálogo das famílias e das pessoas como entre elas. Do autorrespeito das pessoas e comunidades pela decisão de cumprir princípios e responsabilidades; da predisposição em renovar essas atitudes e comportamentos; e da boa vontade dessa geração em garantir a identidade, a história e os valores culturais dos povos sob a guarda dos princípios ecológicos exaltados por Capra (2002); indagar qual a nossa disposição para partilhar o uso e o não uso dos recursos e serviços naturais: a produção, o consumo, o lazer aos presentes; e assegurar também às futuras gerações vida saudável.

E na esfera pública, ao exercitar à cidadania igual, apropriar-se dos benefícios e encargos da cooperação social. E ao dialogar com os valores, crenças e tradições, a cultura local encontra indagações e respostas criativas para superar o desejo utilitarista de uma cultura global em produzir bens e serviços em volumes que ninguém terá tempo de consumi-los; e assim diminuir o fosso entre aqueles que têm as condições materiais e imateriais para realizar suas demandas e desejos, e àqueles desprovidos dos bens primários [riqueza, autoestima, liberdade, felicidade...] pelo difícil acesso à riqueza, privada e pública [inclusive aos tributos].

Assim, o homem e a mulher vão se definindo por sua capacidade de libertar-se, por sua história, por sua inquietação moral, e por aperfeiçoar-se ao longo da vida; eles, no particular e no universal, contemporizam-se para encontrarem-se na história. E ao escrevê-la revive, vive o dia a dia, garante sua continuidade.

Aliás, no período natalino, nesta festa cristã, a história da humanidade é recontada e atualizada com o intuito de iluminar o coração e a mente para o exercício da boa vontade; como auxiliar no enfrentamento de conflitos, ora pelos atos de brutalidade, indiferença e corrupção como pelo trabalho de crianças e adolescentes nas carvoarias, lixões, prostituição etc.; das relações indigestas entre os credos; entre o bilionário e o que não tem o tostão ou pouco tostão; como de si para si.

Esses conflitos confirmam: “o homem desacomodado não é mais do que um pobre animal, nu e dividido”, diz o Rei Lear [Shakespeare]. Ignorá-lo ou fingir ignorá-lo é forjar as relações consigo, a natureza e o mundo.

Celebre o nascimento de Cristo! Celebre no encontro entre as pessoas, as virtudes [Caridade, Castidade, Diligência, Humildade e Generosidade]! Celebre o amor! Celebre a vida!

E Boas Festas, aos rurícolas, aos agricultores, aos extrativistas [...quilombolas, quebradeiras de coco, caboclos e índios] e aos citadinos.

Publicado pela Tribuna Independente, Maceió - Alagoas, 2012





[1]  O Jornal, 21/dez/2010

domingo, 2 de dezembro de 2012

Liberdade ainda que TARDIA

Marcos Antonio Dantas de Oliveira


No Brasil [1], a participação na renda total dos 10% mais pobres em 1960, era de 1,9%, cinquenta depois regrediu, em 2011 foi de 1,6%; e a renda dos 10% mais ricos que era de 39,6% praticamente continuou a mesma 39,3%. Mas o discurso daqueles que dão ordens e daqueles que dão conselhos, é que a desigualdade vem diminuindo.

Em Alagoas, vida caótica, mais de 60% da população ganha até ½ salário, em maioria, rurícolas, agricultores, extrativistas, [povos e comunidades tradicionais] trabalhadores de aluguel e suas famílias. Outro dado, o déficit habitacional rural em Alagoas é de 40.000 lares (Ministério das Cidades, 2005).

Maceió e Arapiraca, principalmente por êxodo rural como por empobrecimento de citadinos, a favelização. Essa miséria está em expansão, da pouquíssima renda ao maltrato à natureza, do precário serviço de saúde e educação à crescente violência: roubos e homicídios, trabalho e prostituição, também por aqueles de menor de idade –“Meninas se prostituem por apenas R$ 2" [2] ­– um despautério.

E como o lugar rural está associado à ausência de facilidades sociais de toda ordem e, diante da débil ordenação política, social e patrimonial, seu desenvolvimento está ao capricho de políticas públicas clientelistas como conformistas. É visto como o lugar do atraso [ignorância e superstições], caracterizado pela pobreza [econômica e política - baixíssimo exercício de cidadania igual] e por indicadores sociais baixos.

Ainda assim, adultos, adolescentes e crianças dessas categorias, enquanto coletores, caçadores, produtores e consumidores de bens e serviços da natureza não dissociam o local do trabalho, da moradia, do lazer de suas manifestações culturais; por isso, neles o sentimento de pertencimento não é retórica, é vida compartilhada. Nesse sentido encantam-se com os biótipos, biótopos e biomas [pela harmonia aparente]; pois, eles relacionam-se estreitamente do modo de produzir, consumir, divertir ao assumir responsabilidades com a família, a vizinhança e a natureza – das relações de produção ao temor a Deus, do uso e não dos recursos e serviços naturais ao controle dos tributos.

Esta ocorrência assevera o processo de dominação e controle social [que se dá na esfera privada] por uma minoria rica citadina. E os rurícolas, agricultores e extrativistas familiares [povos e comunidades tradicionais] usam sua lógica cultural: natureza [terra, cultivos e mitos], ocupações [trabalho e renda], e família [mais-valia, patrimônio imaterial, sucessão] têm seus rituais e ritos de passagem ameaçados pelas dificuldades para incorporar novos hábitos e tecnologias por estarem descapitalizados, serem analfabetos, e assim reproduzirem-se e fixarem-se ao lugar rural. 

Contudo, o lugar rural por apresentar laços de proximidade, vizinhança e confiança entre seus moradores e respeitoso com a natureza aumenta a capacidade do rurícola, do agricultor e extrativista familiares de desenvolverem, sustentarem e aperfeiçoarem ao longo da vida suas lógicas familiares: podendo até acumular riqueza privada, ao pagar os tributos fiscaliza-os para beneficiar-se da riqueza pública.

Essas categorias têm papel relevante como usuário, coletor, produtor de alimentos e energia, e também como protetor da natureza atendem aos interesses de bem-estar da sociedade e da governabilidade do estado. E assim, os acadêmicos averiguam que eles não sucumbiram aos processos e efeitos da racionalização capitalista, devido ao vigor de  suas lógicas e das amenidades naturais e rurais; e ainda atraem novos moradores e turistas vindos da cidade.

É no locus da política que se dar o debate sobre o controle dos recursos e serviços naturais, tributos, e das políticas públicas [distributivas, redistributivas e reguladoras e constitucionais], dever ser caracterizado pelas liberdades reais, interesses particulares e negócios coletivos; é o planejamento principalmente o estratégico, o instrumento definidor de políticas públicas [ações, orçamentos] que visem não só ao conforto material, mas a busca incessante por qualidade de vida, felicidade, no presente, para além do viés normativo ou ideológico. É estratégico para promover o Desenvolvimento Sustentável [Durável]. Contudo, a problematização do Desenvolvimento Sustentável Rural [conflitos, gestão, justiça social] de tímida não conseguiu sair dos gabinetes, e nas cidades pequenas e no meio rural nem abstração é.

Aliás, as relações de interconhecimento e os vínculos com as cidades devem buscar não só as interações, mas também reconhecer os conflitos e as estruturas envolvidas; e a dialética, a cidadania igual e a liberdade individual [argumentações, mediações e consensos] são caminhos para solucionar as relações de produção, de consumo, de respeito consigo, aos outros e a natureza, no presente e no futuro – Os povos: Macuxi, Taurepang, Patamona, Ingaricó, Uapixana e Wapichana têm suas terras [em Roraima] demarcadas (Petição: 3388 do STF): a garantia do direito de ser [espécie e indivíduo] de ter [abrigo, alimento, sexo]. Enfim de sustentar seus modos de vida, bem como garantir a diversidade ecológica na bacia hidrográfica para todos os povos, hoje e amanhã.

Sobre sua vida caótica, nenhuma categoria [o eu, o tu ou o nós] o aprisiona absolutamente. Liberta-te, tu estás no centro do debate sobre o uso e controle dos recursos naturais, tributos, serviços e políticas públicas, sobre dignidade.

Publicado pela Tribuna Independente, Maceió - Alagoas, 2012

Em tempo de Liberdade Tardia, a poesia de 
Ivanildo Pereira Dantas

A VOZ GRITANTE DA SECA EM VERSOS

A seca... a seca é uma catástrofe...
a seca é animais mortos na beira da estrada
açude seco e solo rachado
mulheres e crianças carregando água...
em latas, baldes e potes de barro

A seca, a terra e a água
junta-se a alma do povo sertanejo
deixando-o sem esperança
sem comida, sem perspectivas de vida
sem teto num calor forte e muito clamor

A seca não queima só a terra e as plantações
queima famílias, animais e corações
desidrata e mata de fome
quem antes de tudo era um forte
e alimentava esta nação

A seca não gera desenvolvimento
gera dificuldades sociais para os que habitam a região
provoca falta de recursos econômicos
gerando fome e miséria
ao povo forte do sertão...
também gera tristeza
fome, amor e traição
revolta, miséria e dor
saque e tentações

numa terra de paixão e de amor
Na seca aparece de tudo
os políticos inescrupulosos e desonestos
o jeito hipócrita, e maldoso de governar
ações paliativas e as falsas promessas
e a omissão da sociedade em não querer enxergar.








[1]  Revista Veja, 10/out/2012
[2]  Tribuna Independente, 25/mar/2012