sábado, 25 de janeiro de 2014

É IMPOSITIVO acolher as crianças

Marcos Antonio Dantas de Oliveira


Retirantes do campo, agora trabalhadoras no lixão de Arapiraca, como tantas outras de sua idade em qualquer lugar de Alagoas e do Brasil. Crianças e adolescentes pobres de 5, 9, 13, 17 anos enfrentam o batente do trabalho nos cortes da cana-de-açúcar, nas lavouras de fumo, nas olarias, nas carvoarias, nos lixões; e no desempenho de tarefas como cuidar de pequenos animais, hortas e dos irmãos mais novos.

“O uso da mão de obra infantil é cada vez maior no mundo”, segundo artigo ‘Enfeite de Natal, trabalho infantil’ [1]

Por que parcela da sociedade brasileira ainda defende trabalho infantil e minimiza tal despautério? [http://reporterbrasil.org.br/trabalhoinfantil/a-naturalizacao-do-trabalho-infantil/]

“Crianças são flagradas viajando penduradas em caminhonete em Alagoas” [leia mais no http://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/2013/12/criancas-sao-flagradas-viajando-penduradas-em-caminhonete-em-al.html]. Ainda outras deixam de ir à escola para se prostituírem em troca de alguns poucos reais. Ah, lembrados pela presença angelical nos prostíbulos – ”Trabalho infantil é um passo à prostituição”[2].

E também pelo assédio de adultos pervertidos – http://g1.globo.com/fantastico/noticia/2014/01/prefeito-de-coari-am-e-acusado-de-abuso-sexual-em-meninas-de-9-15.html. Ou de alguns mais reais para traficar drogas - "Meninos de 12 anos são cada vez mais usados por traficantes" [3].

Tem mais: "juízes e promotores de Justiça de todo país concederam, entre 2005 e 2010, 33.173 mil autorizações de trabalho para crianças e adolescentes menores de 16 anos, contrariando o que prevê a Constituição Federal” [segundo, Ministério do Trabalho e Emprego [4]]. Uma afronta ao Estatuto da Criança e do Adolescente/ECA.

E Cipola [2001], diz: “uma pessoa que começa a trabalhar aos 7 anos vai receber em média ao longo da vida 50% menos do que receberia se tivesse iniciado aos 21 anos, no mercado de trabalho”. Para o IBGE, é população economicamente ativa, pessoas de 10 anos ou mais; oficializa o trabalho infantil.

É o setor agrícola quem mais usa essa mão de obra, e na agricultura familiar é mais intensa. Primeiro pelo hábito secular dos agricultores de que o trabalho das crianças e dos adolescentes reforça o orçamento familiar, o que parece ser uma verdade, ainda que perversa e à margem do ECA.

Pelo primitivismo das sociedades ricas, dos ‘donos do poder’, dos que dão conselhos e dos que dão ordens em manter a má distribuição de renda; o trabalho infanto-juvenil é a forma mais perversa para preservar pais e filhos sem opções de escolhas múltiplas: da oferta do serviço à remuneração decente; da desobediência e ou ausência de marco legal às relações sociais, econômicas e ecológicas; do não acesso à educação, saúde, moradia ao lazer; e ainda agrava a situação de suas crianças impossibilitadas de terem uma alimentação qualitativa diária para seu desenvolvimento muscular e intelectual, e de frequentarem a escola.

Pela falta sintonia e eficácia entre eventos e estratégias que tratam da ilegalidade do uso da mão de obra infanto-juvenil; e pela ausência de práticas que assegurem aos pais e filhos assento no debate sobre o controle dos recursos naturais e tributos, e na formulação, implementação e correção de políticas públicas que atendem ao clientelismo dos gestores, sob o viés do sabe com quem está falando. 

Outro dado, renda abaixo de R$ 2.765,44 para uma família de 04 pessoas [Dieese – salário de dezembro de 2013], não atende às necessidades de moradia, alimentação, vestuário, educação, saúde, transporte, previdência, lazer [Art. 7º da Constituição Federal]; vive em estado de pobreza. Aliás, para o governo família com renda per capita entre R$ 291 e R$ 1019, é classe média [http://www.sae.gov.br/site/?p=17351]. Perdemos a noção do que é ser pobre num país em berço esplêndido? 

Bem como reforçando e registrando outro infortúnio: “Escola de Monteirópolis, Alagoas, tem a pior nota do IDEB no país [1,8 para as séries da 1ª a 5ª, e nota 1,6 da 6ª a 9ª]” [5]. Leia mais sobre educação - 
http://www.opovo.com.br/app/maisnoticias/mundo/2014/01/29/noticiasmundo,3198469/brasil-ocupa-8-posicao-por-numero-de-analfabetos-adultos-diz-unesco.shtml

No Brasil dos 2,8 milhões de nascidos 6,2% [187 mil] não têm registros nos cartórios [6]. "Ninguém deve ser reduzido a seu nascimento", enfatiza Eleni Varikas (2001). Essa é uma das promessas menos cumpridas de um regime democrático.

“A taxa de pobreza entre as crianças até 4 anos é hoje de 28,3%, já incluído a Bolsa Família da mãe, o salário do pai, a aposentadoria dos avós”[7]. Vivem em estado de privações pelo consentimento tácito do Estado e da Sociedade, bem como solapam os objetivos do ECA. Por esse despautério, ECA neles!

“Representantes de entidades em defesa da criança e do adolescente foram unânimes em criticar as 41 propostas de emenda à Constituição (PECs) em tramitação no Congresso Nacional que tratam da redução da maioridade penal de 18 anos para 16 anos”. http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/443171.html

Enquanto isso, “a cada ano, país joga no R$ 1 trilhão no lixo – O Brasil do desperdício: corrupção, descaso, incompetência, burocracia, e falta de planejamento do governo sugam o equivalente a todas riquezas produzidas anualmente na Argentina” [8].

Então, as crianças são as mais pobres multidimensionalmente [sobretudo têm sua expectativa de vida encurtada] entre as várias categorias sociais; portanto qualquer política pública deve ser feita visando o bem-estar da criança, como criação máxima da espécie humana.


A pesquisadora Tereza Belton da Universidade East Anglia, na  Grã-Bretanha, anuncia: “crianças devem ser motivadas a ficarem  ociosas e entediadas para desenvolverem sua capacidade criativa,  afirma uma especialista em educação – se atualize, acesse  o  http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/04/130404_tedio_criancas_criativas.shtml

Está satisfeito com essas políticas? Urge para o Desenvolvimento Sustentável, uma concertação de ações de cidadania, de liberdades e de políticas públicas às crianças e adolescentes rurícolas, que empoderadas pelo tirocínio escolar, inclusive ao cursar uma faculdade, poderão fazer melhores escolhas e assegurar os vitais bens primários – autoestima, inteligência, imaginação, saúde e vigor, oportunidades, renda, riqueza, liberdades, direitos, segundo Rawls [2002]; e continua: “os bens primários são presentemente definidos pela necessidade das pessoas em razão de sua condição de cidadãos livres e iguais e de membros normais e plenos da sociedade durante toda a vida” – da fase infantil à adulta, para prosperidade, bem-estar e dignidade intergeracional.

    Publicado pela Tribuna Independente, Maceió/Alagoas
[1]  Publicado pelo jornal New York Times, com o título: Christmas Ornaments, Child Labor. www.ecodedate.com.br/o uso da mão de obra infantil é cada maior no mundo, 26/dez/2012.
[2]  Tribuna Independente [de Alagoas], 30/jan/2012
[3]  Tribuna Independente [de Alagoas], 16/out/2011
[4]  www.ecodebate.com.br/2011/10/24/autoriazadas-pela-justiça-mais-de-33-mil-crianças-trabalham-inclusive-em-lixoes
[5]   Gazeta de Alagoas, 19/ago/2012
[6] Gazeta de Alagoas, 24/dez/2013
[7]    Gazeta de Alagoas, 22/jul/2010
[8] Correio Braziliense, 25/ago/2013