segunda-feira, 26 de setembro de 2016

SIMPLES assim, QUIÇA!

                        Marcos Antonio Dantas de Oliveira[1]
Qualquer debate deve visar à promoção de bem-estar para a sociedade. Destarte, devemos compreender bem-estar como o usufruto de bens tangíveis e bens intangíveis; e John Rawls [2002] nomeia esses bens, ei-los: autoestima, inteligência, imaginação, saúde e vigor, oportunidades, renda, riqueza, liberdades, direitos. E as crianças precisam gozar desse bem-estar – http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2016/09/governo-lanca-sistema-de-monitoramento-para-combater-trabalho-infantil

Decerto que, a prosperidade, a riqueza de um país, de um município, de um negócio está umbilicalmente ligada a quatro forças motrizes: recursos [bens] naturais, bens de capital, capital humano e eficiência de governo. De modo que, o Banco Mundial e a Cruz Vermelha [2005] fizeram um estudo para avaliar a prosperidade nos países e concluíram: no Brasil, os recursos naturais são responsáveis por 18%, nos Estados Unidos e na Europa 2%, cada um; os bens de capital, respondem por 14%, 13% e 17%; o capital humano e a eficiência de governo somado atingem 68%, 85% e 87%, respectivamente. O quê confirma que no Brasil, o usufruto dos bens naturais é mal usado e sujeito à grilagem [a quem serve o Cadastro Ambiental Rural?]; como é baixo o usufruto dos bens de capital, do capital humano e da eficiência do governo, principalmente, pelos 3,9 milhões de beneficiários da Lei 11.326/2006. 

E a competente ineficiência de governo [poder legislativo, executivo e judiciário] assegura através de uma hipnótica mídia que os serviços de educação, saúde pública, arrecadação, fiscalização, a segurança jurídica e a vida privada estão qualitativamente de bom tamanho nesse Brasil, ou seja, nega que além do fosso geométrico entre o nível de renda das diferentes classes sociais, da riqueza patrimonial, do bem-estar acumulado no Brasil por uns poucos; há uma riqueza oculta, que ainda não tem sido estimada e que nos países anglo-saxões é conhecido como rule of law - Estado de direito. Como também é notória a apatia da população pelos assuntos públicos - pelas instituições econômicas e políticas inclusivas locais e globais.
                                                                                                              
Por exemplo: a ‘Reforma agrária’ por não tratar da função social da terra [artigo 186 da Constituição federal]; nem tampouco, do  artigo 4º, inciso III do Estatuto Terra, que trata do módulo rural  é um arremedo surreal. Decerto que, o desenvolvimento da agricultura brasileira está baseado nos ganhos de produti­vidade [Gasques et al., 2012]; e segundo Alves, Souza e Rocha [2012] versando sobre a função de produção agrícola: “um aumento de 100% na renda bruta pode ser explicado pela tecnologia [68%, pelo trabalho [23%] e pela terra [9%]”. Indubitavelmente, o agricultor familiar necessita elevar a produtividade de todos os fatores, mas, descapitalizado e analfabeto, no seu dia a dia continua a usar uma inovação que tem 500 anos de Brasil: a enxada, por falta ou inoportuna orientação, por outro lado, usa inovações atualíssimas: o telefone celular, a internet, mídias espetaculares que devem ser usadas no seu negócio – esse acontecimento não é um jogo de soma zero.

Além disso, o Censo Agropecuário 2006 [IBGE, 2006] registrou cerca de 4,4 milhões de estabelecimentos e, desses, 500 mil [11,4% do total deles] foram responsáveis por 86,6% do valor da produção. Nesse grupo 27.306 estabelecimentos geraram 51,2% do valor da produção. E os 3,9 milhões de estabelecimentos (88,6% do total), geraram 13,4% do valor da produção –  E nesse grupo há 2,9 milhões de estabelecimentos [66,0% do total] que contribuíram com 3,3% do valor da produção. Deixando claro que poucos estabelecimentos produziram muito e, que muitos estabelecimentos produziram muito pouco –  https://www.youtube.com/watch?v=roaHOYLZG_Y

Entrementes, a renda bruta dos estabelecimentos de até 100 ha varia: de maior que zero até 02 salários mínimos; de 02 a 10 salários; de 10 a 200 salários e; maior de 200 salários mínimos. Na primeira classe, 2,9 milhões estabelecimentos [66,0% do total] geraram por mês 0,52 salário mínimo. No Nordeste vivem 57,2% deles. Em Alagoas, 97,4% do total dos estabelecimentos têm até 100 ha [Censo Agropecuário, 2006, IBGE, 2006] – nessa classe, a renda baixa inviabiliza até os empregos ilegais, inclusive, em maioria na atividade agrícola.

E Duarte et al.[2006] constata: para cada R$ 1,00 gerado da agricultura familiar: R$ 0,18 ficam para quem comercializa sementes e outros insumos; R$ 0,70 ficam com quem industrializa e comercializa. Portanto, da renda gerada por esse agronegócio, só 12% é apropriado pelo agricultor familiar, confirmando sua penúria social. Nesse sentido, o agricultor familiar é um grande transferidor de renda – transfere dos capitais: água, solo, fertilidade, trabalho familiar não remunerado, jornada ampliada [incluído o trabalho infanto-juvenil e da mulher] e preço de mercado inferior ao custo de produção [inclusive por não saber ler] – à conta-corrente dos setores dominantes à montante e à jusante do agronegócio: o industrial, o comercial, o financeiro e o estatal. É público e notório que sua família precisa de outras rendas econômicas e de uma política de renda redistributiva, pois, vive à margem da renda mínima proposta pelo Dieese de R$ 4.013,08 [para setembro/2016], para dar resposta ao artigo 7º da Constituição federal.

Outro agravante: o pouco acesso ao mercado interno [principalmente o de compra governamental] e ao mercado externo dos seus produtos in natura, artesanais e industrializados. O governo federal precisa garantir que o Sistema Harmonizado de mercadorias da Organização Mundial do Comércio/OMC – o Acordo sobre Agricultura [baseado nos critérios: apoio interno, acesso a mercados, subsídios à exportação] não exclua os beneficiários da Lei 11.326 com suas ofertas e demandas inelásticas de produtos e serviços a esses mercados desafiadores. Mais outro agravante chama nossa atenção, a baixa renda da população: 79,02% tem rendimento de até 03 salários mínimos, contudo, é quem paga mais impostos, 53,79%  – http://economia.uol.com.br/noticias/infomoney/2014/08/14/injusto-quem-recebe-ate-tres-salarios-minimos-e-quem-mais-paga-impostos-no-brasil.htm
                                                  
Certo e sabido é que os beneficiários da Lei 11.326, a maioria minifundiários, entre eles: os jovens rurais, em geral, têm dificuldades para preservar e utilizar os recursos naturais, os impostos e o Big Data; não têm capitais para financiar o custo de produção real, nem à adoção de inovações, ocasionando danos à alavancagem da produtividade de todos os fatores; têm dificuldades para preservar e usar o patrimônio imaterial, a exemplo do folclore, da alimentação típica e da atração turística; pouquíssimos usam a certificação de indicação geográfica e ou da agricultura orgânica [agroecológica]; outros poucos fazem a militância associativista; a maioria tem prejuízos econômicos por negociarem em mercado imperfeito, inclusive suas cooperativas; e pelo contínuo êxodo de jovens, perde-se o bônus demográfico. E revelam uma gestão ineficiente com danos à sua renda, ao seu bem-estar; e de certo modo, esgota-lhes a capacidade para empreender e expressar os benefícios da multifuncionalidade de sua lógica familiar [terra, trabalho e família] à sociedade contribuinte e consumidora.

Seu negócio, a agricultura, para a maioria, é insustentável econômica, ecológica, social e patrimonialmente. E ao aumentar a pegada ecológica degrada a biocapacidade da natureza repercutindo negativamente no montante de terra e água e de mão de obra que poderia prover-lhes bens e serviços sustentáveis. Por isso, devem exigir que os governos disponibilizem serviços públicos essenciais de qualidade, entre eles: o serviço de pesquisa agropecuária e de extensão rural, aliás, nesse serviço os governos gastam pouco e mal para promovê-lo junto à sociedade, enquanto, atividade de educação não-formal continuada e permanente [Lei 12.188/2010] para orientá-los em modelos de negócio e na colocação dos produtos e serviços certificados, sustentáveis e rentáveis, no mercado à disposição da sociedade; e nos estados nortistas e nordestinos, esse serviço é ineficiente – um despautério governamental pela apatia da sociedade. Ah, seu negócio se realiza e se reproduz se estiver em sintonia: o serviço eficiente [inclusive o de pesquisa agropecuária e extensão rural, e de saúde pública], a organização da produção do entorno, a estabilidade da relação preço do produto-preço do insumo, a oferta e demanda elásticas do produto e serviço certificados e o poder aquisitivo da sociedade - mercado perfeito.
           
É no locus da política que se debate o controle dos recursos naturais, dos tributos e das políticas públicas [distributivas, redistributivas, reguladoras]; das incertezas social, econômica e ecológica; das liberdades fundamentais; dos negócios privados e públicos, individuais e coletivos; dos princípios da Administração pública; do bem-estar. Como prosperar em bem-estar se não há usufruto dos bens primários propostos por John Rawls [2002]: autoestima, inteligência, imaginação, saúde e vigor, oportunidades, renda, riqueza, liberdades, direitos. Se o controle e o uso dos bens naturais e dos impostos estão sob a guarda do ‘príncipe’. Se o Estado, enquanto uma associação de iguais, não tem um Projeto de Desenvolvimento Sustentável. 

Esses beneficiários e os stakeholders presentes nos ambientes e arranjos institucionais ou não necessitam de governança e governabilidade eficazes para solucionarem os agravos ao bem-estar; pois o bem-estar proposto por John Rawls se efetiva pelo exercício do Estado de direito com todos numa concertação de instituições inclusivas, essas, quando políticas "asseguram a ampla distribuição do poder e restringem seu exercício arbitrário.", essas, quando econômicas "geram uma distribuição mais equitativa de recursos, facilitando a persistência de instituições políticas inclusivas", descreve-nas Acemoglu e Robinson, no livro: Por que as nações fracassam.




[1] Mestre em Desenvolvimento Sustentável, membro da Academia Brasileira de Extensão Rural/ABER, professor da UNEAL, extensionista da EMATER-AL/Carhp, diretor do SINDAGRO, articulista da Tribuna Independente,  Maceió/AL - artigo publicado na Trebuna Independente.
Blog:   sabecomquemestafalando.blogspot.com

domingo, 4 de setembro de 2016

E no SÉTIMO DIA ...



    Marcos Antonio Dantas de Oliveira

... Da criação do mundo, a mulher e o homem escolheram o mundo do trabalho – “comerás o pão com o suor do seu rosto” – está posto o trade-off: mundo do não trabalho versus mundo do trabalho. Milenarmente, o homem deixa de ser coletor e caçador dos produtos da natureza para ser agricultor - agricultura é uma atividade econômica que baseada na preservação e uso dos recursos naturais, na produtividade de todos os fatores, na diminuição dos custos de produção, na certificação do produto, no mercado perfeito, no conhecimento e na eficiência de governo pode assegurar renda e permanência de todos os envolvidos na atividade e promover bem-estar à sociedade.

Em 1775, por pressão do mundo civilizado, o marquês do Pombal ‘liberou’ os índios do trabalho escravo; no entanto, neste século, há uma precariedade multidimensional na vida indígena; de modo que, é real que os índios continuem sua rotina de exigência para que o Estado demarque suas terras - https://www.ecodebate.com.br/2014/09/22/protecao-das-terras-indigenas-ti-em-xeque/
                                       
Já em 1850, o império criou a Lei das Terras, que impedia o acesso à propriedade titulada, a não ser pela compra. E, 113 anos depois, a princesa Isabel ‘liberou’ os negros do cativeiro, mas aos seus descendentes, resta-lhes pedir proteção governamental - https://www.ecodebate.com.br/2016/08/08/quilombolas-pedem-apoio-na-protecao-de-seus-territorios-ameacados-pela-mineracao/
          
Em 1964, o Estatuto da Terra que tem como objetivo acabar com o latifúndio e o minifúndio continua um sonho; e de 1988 para cá, a Constituição cidadã não consegue garantir o acesso a terra para milhões de brasileiros; e os minifúndios com empregos e rendas precários continuam crescendo [80% dos estabelecimentos têm até 14 hectares (IBGE)], em terras inaptas ou com restrição para o cultivo agrícola, principalmente, e ou degradadas por seus antigos proprietários continuam a praticar uma agricultura de sobrevivência e a esvaziar o campo – inclusive pelo êxodo das mulheres.
                                       
Aliás, o Estado executa uma ‘Reforma agrária’ que não leva em consideração o artigo 186 da Constituição federal [o aproveitamento racional e adequado; a utilização dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; a observância das disposições que regulam as relações de trabalho; e a exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores]; nem tampouco, o Estatuto da Terra [Lei 4.504/1964] – que objetiva: o imóvel rural que, direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, absorve-lhes toda a força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área máxima para cada região e tipo de exploração, e eventualmente trabalho com a ajuda de terceiros, daí o fiasco.
                  
Ademais, ao longo desses últimos 500 anos, um feito notável dos foras-da-lei: a grilagem de terras é fato público e notório. E o Cadastro Ambiental Rural/CAR potencializa essa grilagem por deixar a vontade os grileiros de terras privadas e de terras públicas devido a não aplicação dos princípios da Administração pública. A grilagem e o crime aumentam a penúria dos beneficiários da Lei 11.326, por exemplo - https://www.ecodebate.com.br/2016/08/08/crime-e-grilagem-com-uso-do-cadastro-ambiental-rural-car/
                            
De maneira que, até hoje, o acesso à propriedade titulada continua em disputa; a concentração fundiária se estabelece baseada no latifúndio e no minifúndio; e o alto o coeficiente de Gini reforça que a desigualdade continua em alta nesse Brasil de tantas oportunidades, e tem provocado muitas mortes no campo, mortes que têm sido denunciadas pela Comissão Pastoral da Terra/ CPT - e o filósofo Aristóteles há mais de 2 mil anos, já denunciava essa brutal e crescente desigualdade -
https://www.ecodebate.com.br/2016/08/15/acusado-de-tentar-matar-trabalhadora-sem-terra-maior-desmatador-da-amazonia-tem-nova-prisao-preventiva-decretada/



Então, a ‘Reforma agrária’ é uma política surreal. “No ano de 2012, o Brasil assistiu a Reforma agrária alcançar seus piores indicadores em décadas”, segundo a CPT/Regional do Nordeste II. E uma leitura do link que segue confirma como o governo federal é tão ineficiente na execução e fiscalização da política redistributiva -   http://outraspalavras.net/alceucastilho/2016/01/05/reportagem-do-fantastico-sobre-incra-esta-correta-mas-falta-mais-reforma-agraria/

E o desenvolvimento agrário e agrícola continua promovendo desigualdades regionais, econômicas, sociais e ambientais, incertezas, inseguranças e mal-estar por falta de um plano diretor; nesse sentido, políticas públicas capazes de promover a prosperidade e o bem-estar proposto por John Rawls, que se dar pelo usufruto de bens primários – autoestima, inteligência, imaginação, saúde e vigor, oportunidades, renda, riqueza, liberdades, direitos resulta numa quimera. E ao beneficiário da Lei 11.326, de 24 de julho de 2006, resta-lhes contentar-se com o marketing a respeito de sua importância à mesa farta – a agricultura familiar produz 70% dos produtos consumidos. Contudo, a renda bruta dos estabelecimentos de até 100 hectares varia: de maior que zero até 02 salários mínimos; Nessa classe, há 2,9 milhões estabelecimentos [66,0% do total] que geram por mês 0,52 salário mínimo [Censo agropecuário, 2006] – resta-lhes a exuberância de sua penitência.

Nesse sentido, no Brasil, os agricultores e extrativistas familiares, os povos e comunidades tradicionais, os jovens rurais, ainda vivem a procura da terra prometida. Pois, no Brasil rural, 78,4% dos lares com renda per capita até ¼ do salário mínimo estão em insegurança alimentar (IBGE). Um caos: falta-lhes até uma dieta para sobrexistir, e longe do uso do Codex Alimentarius, vivem na contramão do direito à alimentação [uma garantia constitucional]. Aliás, remonta ao período colonial a ineficiente distribuição de bens, serviços e benefícios resultantes da cooperação social e econômica – e numa visão mais larga, os príncipes apropriam-se do controle dos recursos naturais e dos impostos, e do bem-estar em Rawls.

Indaga-se: os beneficiários da Lei 11.326 estão em demasia na terra?

domingo, 24 de julho de 2016

Tá tudo DOMINADO?

Marcos Antonio Dantas de Oliveira


O filósofo Aristóteles (384 - 322 a.C) já denunciava a desigualdade argumentando que não há nenhuma razoabilidade no excesso de bens de uns poucos e na carência de bens de muitos; e o associativismo pode ser uma das ferramentas para mitigar, superar ou romper essa desigualdade? – clique neste link sobre desigualdade: https://www.facebook.com/CanalDaDireita/videos/429849677159569/ 


De maneira que, “quem somos?, é inseparável de onde estamos?, de onde viemos?, e para onde vamos”, nos ensina Morin (2000).


Então, em que medida a cooperativa [o ativismo] será capaz de motivar seus membros a discutirem e criarem mecanismos de garantia não só da gestão empresarial, assegurando trabalho e renda, mas, sobretudo, às condições de usufruto do bem-estar dos “donos-cooperados” em termos econômicos, sociais, ambientais e culturais, assegurando a diversidade de modos de vida em sintonia com o desenvolvimento  sustentável – durável – e seus critérios: social, cultural, ecológico, ambiental, territorial, econômico, política nacional e política internacional (SACHS, 2000); com a alfabetização ecológica e seus princípios: interdependência, reciclagem, parceria, cooperação, fluxo cíclico dos processos naturais, flexibilidade, diversidade (CAPRA, 2002), com usufruto dos bens primários propostos por Rawls (2002): autoestima, inteligência, imaginação, saúde e vigor, direitos, liberdades e oportunidades, renda, riqueza?

                     

E o cooperativismo agrícola [ativismo e a cooperativa] é um dos caminhos possíveis na construção de uma sociedade mais eqüitativa, mais solidária, mais respeitadora da natureza, ajudando, assim, na transformação de áreas rurais com problemas fortes na distribuição dos ativos fundiários, da renda, do acesso aos bens públicos. O cooperativismo tem se constituído em um fenômeno social e econômico que, pela amplitude e por sua manutenção no tempo, pode ser considerado um movimento de caráter massivo que gerou marcas importantes na sociedade.


Partimos do pressuposto de que, na busca pela minimização das dificuldades do seu dia a dia, o agricultor deve buscar no ativismo e na cooperativa importantes estratégias como forma de garantir a gestão eficiente do seu sistema social e de produção pelo acesso e usufruto aos recursos naturais e impostos; à inovação; à comercialização de produtos; à proteção do meio ambiente; ao serviço de pesquisa agropecuária e extensão rural; à segurança jurídica; ao conhecimento;  e às melhorias sociais para assegurar à reprodução e prosperidade do seu modo de vida. Enfim, que articulações as cooperativas agrícolas fizeram – e continuam fazendo – com outros agentes econômicos e sociais, no sentido de buscar compor cenários, nos quais os agricultores atinjam seus objetivos, enquanto “donos-cooperados”.


Enfim, o cooperativismo continua a emular discussões e comentários sobre a importância da educação cooperativista para reformar o ambiente econômico, social, ambiental e cultural; ainda mais, hoje, com essa onda globalizante que devasta os estilos de vida mais prosaicos em nome do consumismo supérfluo, que menospreza os lugares em nome do espaço, do localismo, do globalismo.


No estado de Alagoas, o número de organizações cooperativas ainda é pequeno quando se leva em conta que existe 123 mil estabelecimentos agropecuários, principalmente daquelas que atuam no ramo agropecuário, de crédito e de trabalho; e que ocupam espaços privados e públicos objetivando cumprir seus estatutos – ideário e prática cooperativista. É importante notar e anotar que no Brasil como em Alagoas o baixo grau do ativismo, da prática e da gestão social dos “donos-cooperados” e dos dirigentes dessas cooperativas, do solidarismo repercutem negativamente nos debates e nas alianças [atos, processos e soluções].

                                                                                   

É comum os “donos-cooperados” atuarem de modo apático ao ideário e à prática cooperativista. Por exemplo: é na Assembleia [enquanto instância máxima, que se exercita democracia direta] que se planeja e decide a prática cooperativista, se fiscaliza o cumprimento do estatuto. Chamo atenção para o edital da Cooperatica dos Produtores de Mel de Abelha e Derivados Ltda/COOPMEL publicado pela Tribuna Independente, 19 de janeiro de 2016. Em particular para a chamada em 3ª convocação – com no mínimo 10 (dez) cooperados em condições de votar a seguinte ordem do dia: 1) Reforma estatutária. Ademais, votar esse tema com um número tão baixo, de 10 “donos-cooperados” revela a precariedade da prática cooperativista. Destarte, é crucial uma Assembleia tão esvaziada, ela mostra quão difícil é implementar o Estatuto Social; e reflete principalmente a má atuação dos dirigentes para implementá-lo. Nesse sentido, não tem nem elevado, nem melhorado o ideário e a prática cooperativista alagoana e brasileira.


Outro agravante: a cooperativa é quase sempre sendo ineficaz e malvista em cumprir seu Estatuto social pela baixa participação cognitiva, instrumental, política e social da maioria dos “donos-cooperados” – o menosprezo pelo exercício da democracia direta evidencia-a como uma instituição extrativista tanto política [porque não distribui poder] como econômica [porque não distribui riqueza] como comentam Acemoglu e Robinson, 2012, sobre instituições extrativistas no livro: Por que as nações fracassam. 

  

Mais outro: a prática da reeleição, em geral, efetivou a apropriação do Estatuto Social pelo príncipe. Todavia, em 1844, Lancashire, Inglaterra, os Probos Pioneiros de Rochdale, os tecelões da indústria da flanela, elegiam semestralmente um presidente, um tesoureiro, um secretário; essa prática rochdaliana fê-la, um caso de sucesso saudado até hoje.

 

Nesse sentido, devem continuar a luta para que o ativismo e o projeto social, permanente e continuado, garantam que os princípios cooperativistas adesão livre e voluntária, controle democrático pelos sócios e educação, participação econômica dos sócios, independência e autonomia das cooperativas, cooperação entre cooperativas e preocupação com a comunidade; interpenetrados pelos princípios ecológicos em Capra (2002), pelos critérios de sustentabilidade em Sachs (2000) e pelo usufruto dos bens primários propostos por Rawls (2002) alavanquem o bem-estar com todos associados, livres e iguais.


Assim é preciso avaliar: a intervenção do Estado [e dos governos] e da cooperativa [e dos dirigentes-cooperados], ainda com sua mão de força promovendo a hierarquização de seus interesses “com práticas clientelistas e paternalistas que as da oligarquia política e fundiária” (SABOURIN, 2006). Aliás, “aquele que promove o poder de um outro perde o seu ...”, nos ensina Machiavelli (1998). Indubitavelmente, essa intervenção caracteriza o modo brasileiro de fomentar o ativismo e a cooperativa. Então, “a primeira tarefa dos intelectuais deveria ser a de impedir que o monopólio da força torne-se também o monopólio da verdade” (BOBBIO, 1997).



Pois, para Arendt (2003), “a liberdade situa-se exclusivamente na esfera política”. E Paulo Freire (1996) afirma: o “essencial nas relações [...], entre autoridade e liberdades, [...] é a reinvenção do ser humano no aprendizado de sua autonomia”; é reflexão e ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo. Sem ela, é impossível a superação da contradição opressor-oprimido” (1987) e, sobretudo, das predadoras instituições econômicas e políticas extrativistas. De modo que, é imperioso que as crianças, os jovens e as mulheres, principalmente os rurícolas, participem ativamente dos processos de governança, de governabilidade e de tomada de decisões em instituições econômicas e políticas inclusivas para alavancar seu bem-estar pelo usufruto dos bens primários propostos por Rawls (2002): autoestima, inteligência, imaginação, saúde e vigor, direitos, liberdades e oportunidades, renda, riqueza.


Artigo publicado na Tribuna Independente, Maceió/AL.

domingo, 3 de julho de 2016

NUS e DESACOMODADOS: quem somos?

 Marcos Antonio Dantas de Oliveira[1]
                                                                      
      
             Em meados do século XVIII, o processo de industrialização dava seus passos iniciais e, com ele, a sistematização de trabalho. Nesse sentido, a fábrica, esse elemento novo, provocou deslumbramento na sociedade e as mulheres agora podiam empregar-se, como também as crianças atendiam a esse chamamento, um gesto que modificou a relação entre mulher e homem. O tempo mostrou que essa invenção, a fábrica, foi percebida pelas famílias como um estorvo, pois, com aquele horário, dezesseis horas, não sobravam mais tempo para as conversas sobre o cotidiano, as brincadeiras lúdicas e as crianças ressentiam essa falta. O nascente capitalismo tomou para si as rédeas desse processo sempre em franca e crescente prosperidade da indústria da flanela de Rochdale, da Inglaterra de 1843, os tecelões – adultos e crianças, homens e mulheres –, continuavam a trabalhar com horário extenuante e mal remunerado, tornou-se o senhor das vidas dos operários e de suas famílias. A situação precária sócio-econômica em que viviam os tecelões fez com que estes reagissem.  A ocasião era oportuna para solicitar aumento em seus salários; “hão de ver quem somos nós!” (HOLYOAKE). E, em comissão, lá foram eles, ao encontro dos industriais. Não! Foi a resposta que obtiveram, e alguns deles preferiram fechar as portas de suas fábricas.

 Frustrado o intento. Em um desses dias sombrios de novembro de 1843, os operários resolveram discutir quais soluções seriam possíveis, para o enfrentamento dessa situação de penúria em que se encontravam, e elencaram várias possibilidades: pedir proteção da lei dos indigentes? Deviam migrar? No entanto foram os ideais dos socialistas utópicos, Robert Owen e Doutor Willam king, que nortearam a decisão de criarem um armazém cooperativo de consumo.  E, na noite de 24 de outubro de 1844, a Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale, localizada na Travessa do Sapo, abre suas portas para atendimento aos operários e suas famílias, baseada em princípios [regras] bem estabelecidos: “1 - Governo democrático da sociedade, cada sócio tendo direito a um só voto, independentemente do capital que tivesse investido; 2 - A sociedade estava aberta a qualquer pessoa que quisesse se associar, desde que integrasse uma cota do capital; [...] ; 7- Desenvolvimento da educação cooperativa dos sócios – uma das herança de Owen; 8 - A sociedade seria neutra, política e religiosamente (PINHO). Esses princípios balizam até hoje qualquer estatuto de uma cooperativa onde quer que ela se localize, no hemisfério norte ou sul, nas sociedades ricas ou pobres, em países credores ou devedores.
                                                                                                                   
 E Mladenatz (2003) resume bem a importância dessa organização, afirmando que “a generalização dessas associações permite realizar uma ordem econômica e social capaz de fundar-se não sobre a luta, mas sobre o entendimento, não sobre o espírito da competição, mas sobre a solidariedade, não sobre a dominação da empresa lucrativa, mas sobre a colaboração com o trabalhador”. A idéia de auto-ajuda contida na proposta cooperativista está em constante movimento e, por isso, realiza-se nas mais diversas e numerosas categorias: sociedades, sofrimentos, soluções e desejos. Desde então, tanto outros sonhadores-precursores-estudiosos – Owen, King, Bellers, Fourier, Blanc, Gide, padre Arizmendiarrieta, Boettcher, Benecke, Filene, Pinho, Singer, Mladenatz e outros que continuam a iluminar o mundo com seus ideais e realizações, para transformar o ambiente social. Essa idéia tem ressonância na região fumageira de Arapiraca, Alagoas, Brasil e começa com o entusiasmo de Lourenço de Almeida. Em 1963, funda-se a primeira cooperativa agrícola na região, conhecida por CAPIAL/Cooperativa Agro-pecuária e Industrial de Arapiraca Limitada. Obteve sucesso entre os anos de 1978-1983, hoje vive sua fase de estagnação, mas continua a ser uma referência sobre a execução ou não do seu estatuto social.

Assim sendo, é importante compreender o mundo em que vivemos e também como nos posicionamos no mundo. Dentro dessa ótica, indaga-se: como o associativista pensa e age nas sociedades e nos agrupamentos humanos os mais diversos possíveis para atingir posições confortáveis, garantidoras de relevância social, redistribuição econômica e prudência ecológica em um mundo tão hierarquizado e autoritário? Muitos estudiosos, entre eles Ignacy Sachs e Fritjof Capra, comentam sobre um sistema de produção e consumo respeitador do meio ambiente, onde a sustentabilidade definida como eficácia econômica, social e ambiental atenda às necessidades e desejos da geração atual e das gerações futuras.
                                               
          Esse sistema atende pelo nome de desenvolvimento  sustentável, que é um processo dialético, de desinteresse mútuo, de cidadania igual e de liberdades reais, que compartilhado pelas diversas categorias [conflito] ao preservarem, conservarem e utilizarem os recursos naturais e os tributos, transforma-os em bens e serviços: do autoconsumo ao mercado, do PIB às rendas [gestão] destinados ao bem-estar social e ecológico de todos no presente e no futuro [justiça social] (OLIVEIRA, 2010); elegendo critérios que possam mitigar os danos ambientais, ei-los: social, cultural, ecológico, ambiental, territorial, econômico, política nacional e política internacional (SACHS, 2000), sobretudo baseado na alfabetização ecológica e seus princípios: interdependência, reciclagem, parceria, cooperação, fluxo cíclico dos processos naturais, flexibilidade, diversidade (CAPRA, 2002), promovam o bem-estar com todos pelo acesso e pelo usufruto dos bens primários propostos por Rawls (2002) e van Parijs (1997): autoestima, inteligência, imaginação, saúde e vigor, direitos, liberdades e oportunidades, renda, riqueza.

          De modo que, não há nenhuma razoabilidade no excesso de bens de uns poucos e na carência de bens de muitos, já observava o filósofo Aristóteles (384 - 322 a.C) –  leia mais sobre essa desigualdade crescente: na Carta  Encíclica Papal: RERUM NOVARUM -http://w2.vatican.va/content/leo-xiii/pt/encyclicals/documents/hf_l-xiii_enc_15051891_rerum-novarum.html no http://g1.globo.com/economia/noticia/2015/08/71-mil-brasileiros-concentram-22-de-toda-riqueza-veja-dados-da-receita.html
                                                          
           Destarte, o ativismo e a prática cooperativista são algumas das ferramentas capazes de fazer o enfrentamento e tirar proveito dessa onda globalizante, que tem sido perversa o suficiente, para aniquilar desde os estilos de vida mais prosaicos dos povos autóctones e tradicionais, como também daqueles que sobrevivem das migalhas do processos científico-tecnológico tanto pela tirania do capital e do mercado; pela apatia da maioria dos “donos-cooperados” e da sociedade em cumprir suas normas, pela ineficiência do Estado em assegurá-lo como uma associação de iguais como pela crise de percepção a tudo que nos rodeia e nos amedronta tem inviabilizado nosso bem-estar pelo usufruto dos bens primários: autoestima, inteligência, imaginação, saúde e vigor, direitos, liberdades e oportunidades, renda, da riqueza.
 .
                  





[1] Mestre em Desenvolvimento Sustentável, membro da Academia Brasileira de Extensão Rural/ABER, professor da UNEAL, extensionista da EMATER-AL/Carhp, diretor do SINDAGRO, articulista da Tribuna Independente, Maceío/AL.                                                                   Blog:   sabecomquemestafalando.blogspot.com