segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Um berço esplêndido ao sorrir das manhãs para poucos

Marcos Antonio Dantas de Oliveira[1]


 “A humanidade, nessa Terra, não pode estar reconciliada com ela própria enquanto o luxo de alguns insultar a pobreza de quase todos”, afirma Raymond Aron [2016]. Então, o Brasil necessita reconciliar-se com o Grito do Ipiranga:

Ouviram do Ipiranga as margens plácidas
De um povo heróico o brado retumbante
E o sol da liberdade, em raios fúlgidos
Brilhou no céu da pátria nesse instante

Se o penhor dessa igualdade
Conseguimos conquistar com braço forte
Em teu seio, ó liberdade
Desafia o nosso peito a própria morte!
É o quê os índios, os quilombolas, as quebradeiras de coco, os pescadores artesanais, os seguidores das religiões africanas, as crianças e os adolescentes e outros que são pretéritos e perseguidos, diuturnamente: uma vida em caos – http://veja.abril.com.br/especiais/amazonia-o-que-pensa-quem-vive-nela/

Ó pátria amada
Idolatrada
Salve! Salve!
Mais de 100 mil pessoas vivem nas ruas desse Brasil – http://gazetaweb.globo.com/gazetadealagoas/noticia.php?c=310703.

Terra adorada
Entre outras mil
És tu, Brasil
Ó pátria amada!
É Pátria amada para quem está desempregado, no subemprego, no emprego ilegal, no emprego de um salário mínimo? -http://epocanegocios.globo.com/Economia/noticia/2017/07/epoca-negocios-taxa-de-desemprego-fica-em-13-no-trimestre-ate-junho-diz-ibge.html

Dos filhos deste solo és mãe gentil
Pátria Amada
Brasil!

Ó pátria amada
Idolatrada
Salve! Salve!
Dos grileiros que nos roubam uma importantíssima riqueza pública, os recursos naturais sob a guarda do Estado – https://www.brasil247.com/pt/247/brasil/261686/Maior-grileiro-do-Pa%C3%ADs-operava-dos-Jardins-em-SP.htm
E dos governos que por sua ineficiência, os biomas: amazônico, atlântico, caatinga, manguezal, cerrado, pampas, por exemplo, continuam ameaçados de desaparecerem pela onipresença da ética de compadrio que vigora no balcão de negócios dessa República - ora por insegurança jurídica, por arremedos de fiscalizações e por atuação conjunta de governo e de grileiro. Governo Temer sanciona Medida Provisória (MP) 759/2016, também conhecida como MP da Grilagem –

Mas, se ergues da justiça a clava forte
Verás que um filho teu não foge à luta
Nem teme, quem te adora, a própria morte
Daí a luta, dia a dia, dos que dispõem de pouquíssima riqueza privada [propriedade privada, tecnologia, produção e consumo de bens e serviços, renda] e de riqueza pública [preservação dos ativos naturais, patrimônio imaterial e uso dos tributos]. E aqui se encontram os beneficiários da Lei 11.326/2016 –

Dos filhos deste solo és mãe gentil
Pátria amada
Brasil
Que gentil para os parlamentares que se apropriam dos tributos da sociedade –http://reporterbrasil.org.br/2017/06/empresas-de-deputados-e-senadores-devem-r-372-milhoes-a-previdencia/
Por outro lado, uma mãe nada gentil, pois, a concentração de renda cresce de vertiginosamente em benefícios de uns pouquíssimos, enquanto muitíssimos vivem penúria social crescente. Tal situação exige a onipresença da cidadania para o cumprimento do contrato social posto ou por um novo contrato em que floresçam e dispersem as instituições inclusivas, essas, quando políticas "asseguram a ampla distribuição do poder e restringem seu exercício arbitrário", quando econômicas "geram uma distribuição mais equitativa de recursos, facilitando a persistência de instituições políticas inclusivas", descreve-as Acemoglu e Robinson –http://g1.globo.com/economia/noticia/2016/10/concentracao-de-renda-cresce-e-brasileiros-mais-ricos-superam-74-mil.html

E no estado de Alagoas essas instituições econômicas e políticas extrativistas reinam absolutas ao sorrir das manhãs, confirmando que,

                              Alagoas, estrela radiosa
Que refulge ao sorrir das manhãs
É para pouquíssimos – não é uma estrela radiosa para dezenas de milhares de crianças e de jovens que vivem em mal-estar – http://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/al-e-o-estado-do-nordeste-com-mais-criancas-e-jovens-em-situacao-de-pobreza-diz-pesquisa.ghtml

Da República és filha donosa
Maga estrela entre as estrelas irmãs

Algumas estrelas irmãs acabam baleadas em assalto –
http://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/adolescentes-sao-baleados-ao-tentar-assaltar-acougue-em-arapiraca-al.ghtml

Tu liberdade formosa
Gloriosa hosana entoas
Salve, ó terra vitoriosa
Glória à terra de Alagoas
E outros privilegiados são agraciados com renúncia fiscal com o tributo pago pelos contribuintes –    http://reporternordeste.com.br/blogs/odilonrios/renuncia-fiscal-em-al-somara-r-520-milhoes-ate-final-do-ano-seminario-analisa-efeitos/

Salve ó terra que entrando no tempo
Calma e ovante da indústria te vaz
Dando as tuas irmãs este exemplo
De trabalho e progresso na paz
Que trabalho, progresso e segurança jurídica, se a taxa de produtividade é de 58,4%, pontuação suficiente para deixar o TJ-AL em quinto lugar dos tribunais mais improdutivos – http://www.anoticia.online/2017/09/07/tribuna-de-justica-de-alagoas-e-um-dos-mais-ineficientes-do-pais/
Ademais, as políticas públicas são eficientes em promover o mal estar pela baixa qualidade dos serviços prestados, principalmente, às crianças: da saúde pública à educação, da segurança pública ao lazer, do emprego à renda, a miséria campeia e de modo vigorosa na zona rural devido à onipresença do príncipe – 

Tu liberdade formosa
Ao trabalho, hosana entoas
Salve, ó terra futurosa!

Glória à terra de Alagoas
Em diplomação, Renan Filho prega união e convoca nova emancipação de Alagoas pelo fim da miséria. Três anos depois, Alagoas, tem o pior IDHM do país, segundo o Ipea –
http://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/2016/11/idhm-de-alagoas-no-periodo-de-2011-2014-e-o-pior-do-pais-aponta-ipea.html

Decerto que, para problematizar o bem-estar é necessário que qualquer atividade e função desempenhadas no processo de desenvolvimento sustentável pelos agentes sociais, econômicos e governamentais resultem no bem-estar pelo usufruto dos bens primários propostos Rawls [Uma Teoria da Justiça] – autoestima, inteligência, imaginação, saúde e vigor, oportunidades, renda, riqueza, liberdades, direitos.

De modo que, o Banco Mundial e a Cruz Vermelha [2005] fizeram um estudo para avaliar a prosperidade nos países e concluíram: no Brasil, os recursos naturais são responsáveis por 18%, nos Estados Unidos e na Europa 2%, cada um; os bens de capital, respondem por 14%, 13% e 17%; o capital humano e a eficiência de governo somado atingem 68%, 85% e 87%, respectivamente. O quê confirma que no Brasil, o usufruto dos bens naturais é mal usado e sujeito à grilagem [a quem serve o Cadastro Ambiental Rural e o Código Florestal e o das Águas?]; como é baixo o usufruto dos bens de capital, do capital humano e da eficiência do governo, principalmente, pelos 3,9 milhões de beneficiários da Lei 11.326/2006 –http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/09/1916858-desigualdade-no-brasil-nao-caiu-desde-2001-aponta-estudo.shtml

Brasileiros! Mulheres e homens, jovens e crianças, desobstruam as relações que corroem o desempenho de suas capacidades básicas e de fazer escolhas, dia a dia, devem mitigar, superar ou erradicar a onipresença da ética de compadrio; o extrativismo das instituições privadas e estatais; o fiasco das políticas públicas de educação, saúde e segurança públicas, emprego e renda, de proteção à criança; o narcisismo na comunicação pública – o narciso empobrece cada vez mais o brasileiro, o nordestino, o alagoano, o agricultor familiar, a criança!

Pátria amada
Brasil.






[1] Mestre em Desenvolvimento Sustentável [engenheiro agrônomo], professor da Universidade Estadual de Alagoas/UNEAL, membro da Academia Brasileira de Extensão Rural/ABER, diretor do Sindagro, Blog:   sabecomquemestafalando.blogspot.com 


26 comentários:

  1. Um texto vibrante que mostra o fosso entre a utopia escancarada no hino e o estado de mal-estar da grande maioria dos brasileiros. Toninho

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  2. E a nossa indisposição para exercer a cidadania. Carlos

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  3. interessante o formato usado para falar de utopia e pobreza. Susanna

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  4. Criativo esse formato! Vera

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  5. Longe da realidade os hinos, mas o texto o coloca na mesma dimensão. Jason

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  6. Gostei porque nos deixa atento à leitura. Rosa

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  7. Nos provoca cada vez mais, aplausos! Ricardo

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  8. Nos revela o trade-off entre promover o bem-estar e o mal-estar. Humberto

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  9. Acertou em cheio os problemas dos brasileiros e possíveis soluções. Fernando

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  10. O fosso continua crescendo entre ricos e pobres; nesse sentido é importante exercer nossa cidadania. Lauro

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  11. Bom para refletir sobre os rumos de nossa vida. Maria

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  12. O texto nos lembra como a independência do Estado ainda tem caminhos urgentes a serem questionados e resolvidos. Marcelo

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  13. A forma de escrever nos ajudou a entender melhor a pobreza. Aldo

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  14. Acabando de lê esse texto bem postado sobre utopia e pobreza dos brasileiros. Valeu. Augusto

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  15. É verdade a ética de compadrio arruína as relações sociais. Hugo

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  16. Sua atenção com as crianças em seus textos é uma referência para o desenvolvimento do Alagoas. Vinicius

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  17. Uma boa forma de denunciar a pobreza em Alagoas. Rildo

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  18. Interessante e oportuno. Geraldo

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  19. Provocações, essa é uma palavra que gosto e que aplico ao texto. Muito boa a forma de comemorar o 7 de Setembro. Erik

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  20. Concordo com o Erik.Alice

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  21. A cana é um exemplo de instituição extrativista bem como a comunicação pública apropriada pelo governo de plantão em benefício próprio. Gabi

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  22. Realmente o hino nacional brasileiro não demonstra nada da atual situação do Brasil. O governo é o único que tem as forças mostradas pelo hino, mas infelizmente o próprio governo guarda essas forças para si próprio, escondendo assim do povo brasileiro. Adiel Faustino.

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  23. Todo setembro, minha mãe conta a mesma história: "Na minha época, tínhamos que ficar perfilados todos os dias antes da aula começar para cantar o hino e hastearmos a bandeira. Na minha época tínhamos respeito ao país e aos seus símbolos."
    E após escutar isso, paro, penso e vejo que ela está certa, vejo que hoje as crianças não sabem nem o significado da palavra hino, o que dirá saber o hino nacional. No início de minha vida estudantil ainda vive essa experiência que minha mãe relata. E deve ser por isso que minha geração ainda tem algum respeito pelos símbolos do país.
    Aqueles que fingem ter respeito, na verdade, por preguiça, decorou apenas a primeira frase do hino, ou melhor, nem isso conseguiu decorar direito, mas a tomou como lei: "Deitado eternamente em berço..." E aí fica, deitado todo o ano, vendo impostos subir, preços absurdos praticados pelo governo, roubos, desvios, superfaturamentos. Mas há um minuto em que muitos acordam e vão as ruas. Que beleza! É lindo ver as ruas tomadas de brasileiros que grita, lutam, esbravejam... porque o "time do coração" perdeu mais um jogo ou o título. Todo dia perdemos um jogo para o preço da gasolina, do gás de cozinha, para falta de investimento em educação, saúde, segurança. Todo dia é um 7 a 1 diferente.
    Resta agora aprendermos a segunda estrofe da segunda parte e quem sabe conseguirmos um dia conquistar todo o restante do hino. "Em berço esplêndido".

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