sábado, 4 de agosto de 2012

SOBRAS, sabe para onde elas vão?


 Marcos Antonio Dantas de Oliveira

Por curiosidade leia nos jornais: os Editais de convocação de assembleias de cooperativas e note, é comum nesses editais a quase ausência do importante princípio estatutário: a distribuição de sobras – “Eu entrei no site das cooperativas do Brasil, e no final do ano, os lucros são divididos entre os cooperados, e aqui em Pindorama ninguém ver ou sabe para onde foi ou vai”, diz Maria José [Alagoas Negócios, 31/jul/2009]

Ainda assim, apático e ou sem entender bem do seu negócio – a cooperativa – o dono-cooperado acredita que ela é uma ferramenta relevante para minimizar as dificuldades do seu dia a dia.

E fascinando pelo ideário cooperativista, insiste na tese de que a cooperativa ajuda na execução de estratégias que lhe garanta a sustentação do seu sistema produtivo e social ao  acesso aos insumos; da valorização da sua mão de obra ao seu uso e não uso dos recursos naturais; do seu patrimônio imaterial à arrecadação e distribuição dos tributos; da comercialização dos seus produtos e serviços aos encargos e benefícios da cooperação social, sobretudo, da sua liberdade individual.

Entre as estratégias: a criação de um fundo de capital, oriundo dos depósitos de seus membros, e do resultado econômico dos negócios da sociedade, a sobra. Ela é vital essencialmente para melhorar seus estilos de vida [e reproduzí-los]. Esse fundo de reserva tanto é o ponto de partida para o êxito da cooperativa, como a distribuição de sobras é a garantia de que seu negócio está sob seu controle; e ainda anima a militância.

Na Inglaterra de 1848, a Sociedade dos Pioneiros de Rochdale, dos tecelões da indústria, sabiamente destinou também das sobras – 2,5% para fins da educação geral. E essa regra auxiliou em muito o engrandecimento da cooperativa como instrumento de enfrentamento para a melhoria das condições sociais e econômicas dos donos-cooperados. E deu-lhe fama mundial.

Em Alagoas, começo dos anos de 1980, a Cooperativa Agro-pecuária e Industrial de Arapiraca [Capial] praticou a distribuição de sobras e proporcionou acesso: a redistribuição econômica e patrimonial – com incremento das riquezas privadas –, e a melhoria dos serviços sociais aos donos-cooperados e moradores da região; e consolidou a região fumageira como centro de debates dos citadinos, rurícolas e agricultores familiares, tanto para formular, executar, avaliar e corrigir as políticas públicas de segurança alimentar, lazer, saúde, renda, alfabetização, associativismo, comercialização, uso e não uso dos recursos naturais, consumo e tributos.

Em tempo: o associativismo nessa região nasce com a Capial, em 1963. Então, do pioneirismo da Capial [e do entusiasmo de Lourenço de Almeida] vieram os sindicatos [fins dos anos 60] e as associações [início dos anos 80]. Mas, foi à distribuição de sobras que lhe deu fama regional.

Assim as regras têm relevância na consolidação da cooperativa, enquanto ativismo e projeto social; por isso, os donos-cooperados necessitam fortalecê-las em suas organizações. Foi vital, o uso da regra distribuição de sobras pelos Pioneiros de Rochdale como pelos Pioneiros da Capial, na Região Fumageira de Alagoas. 

Ademais, o ativismo e a prática cooperativista são caminhos para construir uma sociedade mais eqüitativa, mais solidária, mais respeitadora da natureza; ajudar na transformação das áreas rurais com fortes problemas na distribuição dos ativos fundiários, da renda, do acesso aos bens primários e serviços públicos; e que o associativismo por seu caráter massivo, por amplitude e por sua manutenção no tempo continue dialetizando ideias e experiências ecológicas [ciência e saberes] e culturais [conjunto de ferramentas, hábitos, instituições, normas, rituais, ritos, aprendizados, sentimentos, atitudes etc. que um agrupamento humano possui] para o bem-estar, à dignidade de todos.

Pois, o que sustenta a cooperativa ao longo do tempo é a capacidade estratégica dos donos-cooperados de discernir e antever o que é essencial para gerar continuidade de seus negócios nos diversos contextos e cenários; é a consonância com a evolução das demandas da sociedade, dos indivíduos, cooperados e não cooperados. E nesse sentido, revela que o arranjo de idéias e realizações de homens e mulheres [de jovens] que acreditam: a cooperativa é mais do que uma ferramenta econômica, é a consolidação de aspirações idealistas; sobretudo, de elevado caráter social e democrático.

Aos donos-cooperados à apropriação do resultado econômico do seu negócio, as sobras. A distribuição de sobras é vital para elevar a cooperativa e o associativismo, e resguardar o acesso e usufruto dos bens primários [renda, alimentação, inteligência, liberdades fundamentais, cidadania igual, felicidade...], à dignidade dos donos-cooperados e suas famílias.

Publicado pelo jornal: Tribuna Independente, Maceió - Alagoas, 2012.

7 comentários:

  1. Oportuna essa sequência de textos sobre o cooperativismo e cooperativa. Roberto

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  2. Caro Marcos Antonio,

    Que utilizemos o Ano Internacional das Cooperativas para discutir e reforçar os princípios do cooperativismo.

    Kleber Santos
    Coordenador
    DENACOOP/SDC/MAPA.

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  3. E essa apatia também contamina muitos técnicos. Maurício

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  4. Sua colocação sobre bens primários é de relevância. Marcos

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  5. Como as cooperativas estão longe de atender os cooperados. E parabéns a Maria José. Toninho

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  6. A colocação de Maria José é corriqueira. Gabriela

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  7. Parabéns pelo texto. João

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