domingo, 22 de junho de 2014

A exuberância do PENITENTE!

                      Marcos Antonio Dantas de Oliveira[1]

     Os agricultores e extrativistas familiares, os povos e comunidades tradicionais, via de regra, praticam uma agricultura de sobrevivência, ainda resultante do "caráter estrutural da ‘brecha camponesa’ no sistema escravista, com sua lógica subjacente" [CARDOSO]. E em maioria, continua sem acesso a terra. Não obstante, a Reforma agrária é meramente uma peça publicitária do Estado brasileiro; uma vez que, não cumpre a função social da propriedade [Artigo 186 da Constituição federal]; e que implica também em altos custos para os contribuintes. 

    Essa importante política pública redistributiva está tão impregnada de clientelismo político, que afeta tanto àqueles que recebem a terra pelo INCRA como àqueles que adquirem pelo Crédito fundiário: nesse caso, compromete ainda mais o Bem-estar da família tomadora desse crédito – Consuma-se assim uma dívida multidimensional. Portanto, a Reforma agrária brasileira só aumentou o número de imóveis de até 100 ha, eles representam 86% do total [INCRA, 2009], via de regra, são minifundiários com imensas dificuldades para realizar práticas agroecológicas e sucessão familiar, por exemplo.

     Então para dar a concessão de terras a essas categorias [pelo INCRA] ou ofertar crédito para a compra de propriedade [pelo Crédito Fundiário], o governo deve ter como primeiro critério: o acesso ao módulo rural - A propriedade familiar é aquela que atende a Lei 4.504/1964.

     E tem mais: a maioria vive em moradia insalubre, e tem dificuldade de acesso ao Programa Nacional de Habitação Rural/PNHR; com financiamento agropecuário ainda baixo para atender as demandas dos beneficiários da Lei 11.326; só R$ 24,1 bilhões [Safra 2014/2015]. É pouco dinheiro para assegurar que a unidade social aumente a produtividade de todos os fatores como para promover o Bem-estar da família e da sociedade.

     Para completar seus filhos frequentam escolas com IDEB baixo; e a política de educação do campo é um fiasco. É a educação [o tirocínio escolar] uma das molas impulsionadoras do desenvolvimento sustentável e do Bem-estar de uma sociedade.

     Descapitalizados, não têm recursos para pagar pelos serviços de pesquisa agrícola e extensão rural, e por regra geral, ineficientes, inclusive o estatal. E assim continuam transferindo suas mais-valias para os setores: financeiro, industrial, comercial e estatal, para os bolsos de uns poucos ricos.

   Nesse sentido, fica-lhes difícil utilizar os recursos naturais e artificiais, os cultivos, a mão de obra, de modo sustentável para promover o incremento de suas rendas agrícolas e não agrícolas, sem um mercado capaz de absorver os produtos e serviços gerados pela falta ou insuficiência de renda da maioria da população; e assim esgota-lhes a capacidade para empreender usando a Lei 11.326, com sérias implicações para o acesso e o usufruto dos bens primários: autoestima, inteligência, imaginação, saúde e vigor, direitos, liberdades e oportunidades, renda, riqueza [RAWLS]. E que as políticas públicas executadas e em execução, via de regra, são pífias para dar conta de avanços para essas categorias, inclusive à sucessão no negócio rural/agrícola.

    Assim, suas dificuldades não foram nem amenizadas, por exemplo, 40% da renda é destinada à alimentação. E o agricultor familiar mesmo com o crescimento da renda mensal média familiar passando de R$ 1.138 em 2003 para R$ 1.499 em 2009, um acréscimo em torno de 32%. É uma renda baixa para satisfazer às necessidades e às demandas de uma família de quatro pessoas por domicílio, em resposta ao artigo 7º da Constituição federal.

  Os agricultores e extrativistas familiares, os povos e comunidades tradicionais, e os jovens rurais estão sem renda líquida para participar ecológica, social e politicamente do acesso e do usufruto dos bens primários [RAWLS], do usufruto do Bem-estar. Em Sergipe, mais de 42 famílias quilombolas serão desapropriadas de sua terra. Confirme no http://site.adital.com.br/site/noticia.php?lang=PT&cod=80807  

     Eis seu exuberante infortúnio! Eis o exuberante agricultor familiar!


Publicado pela Tribuna Independente, Maceió/Alagoas

[1] Mestre em Desenvolvimento Sustentável, membro da Academia Brasileira de Extensão Rural/ABER, professor da Universidade Estadual de Alagoas/UNEAL, extensionista da EMATER-AL/Carhp    
 Blog: sabecomquemestafalando.blogspot.com


16 comentários:

  1. Não me supreendo mais com suas lúcidas considerações. Toninho

    ResponderExcluir
  2. Bem pontuada suas colocações sobre a necessidade de uma educação de qualidade. Oto

    ResponderExcluir
  3. O título já faz a gente acordar para uma reflexão sobre a penúria do agricultor familiar. Mauricio.

    ResponderExcluir
  4. Buenas Xiru
    Belo artigo, sugiro que desenvolvas uma espécie de continuação deste, abordando o custo de manter os agricultores no campo versos cidade.
    Ab. Álvaro

    ResponderExcluir
  5. Concordo com o Álvaro, belo artigo. Vanessa

    ResponderExcluir
  6. A precária situação dos quilombolas em Sergipe resulta da ineficácia do governo em cumprir os dispositivos constitucionais, principalmente. Marcos

    ResponderExcluir
  7. Suas informações são significativas amigo Marcos, continue nos enviando.

    Abraço

    Prof. Alonso

    ResponderExcluir
  8. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

    ResponderExcluir
  9. Parabéns Colega Marcos, pela sua continuada produção intelectual. Mário

    ResponderExcluir
  10. Precisamos entender mais sobre multidimensão do homem, e o Marcos chama nossa atenção sobre isso. Manoel.

    ResponderExcluir
  11. Seus textos são oportunos. Celso

    ResponderExcluir
  12. Sempre lembrando o abandono aos jovens rurais. Renata

    ResponderExcluir
  13. Estou aguardando outro livro seu. Parabéns, Edson

    ResponderExcluir