Marcos Antonio Dantas de Oliveira
Não ter vida digna. E o agricultor e sua família, mesmo sendo responsáveis por 77% da mão de obra ocupada, por 54% da produção leiteira, 84% da produção de mandioca e por 67 % da produção de feijão, ainda não têm acesso aos bens e serviços de produção e de consumo, como um direito líquido e certo. E ao verificar sua baixa participação no PIB brasileiro [10%] confirma-se, essa sua condição. E mais, mesmo com 90% dos estabelecimentos agrícolas familiares, os bens e serviços produzidos nessas unidades produtivas deixam-lhes uma pequena renda, quase em geral sem lucro – “lucro é o que pode consumir durante uma semana e sentir-se tão bem no final como se sentia no início”, diz o economista Hicks (K.Most, Accounting Theory, 1977). Então, conhece algum agricultor familiar que obtém lucro?
Vida difícil, por isso é relevante entender como se realiza a lógica do agricultor e do extrativista familiares – terra, água e biodiversidade [cultivos, coletas e mitos], trabalho [ocupações e renda] e família [patrimônio imaterial e lazer, posse e transmissão] – em municípios com indicadores sociais, econômicos e ecológicos de regulares a ruins; e ainda com um cenário desfavorável para aqueles que cultivam pequenas áreas, a promover danos continuados ao tecido social e familiar. Aliás, nessa lógica impera a desigualdade, o egoísmo comuns à esfera privada; e também, é marcada por grande heterogeneidade: ora pelo tamanho da área [até 04 módulos fiscais]; alto grau de dependência por uso e não uso dos recursos naturais; acesso as inovações; difícil pelo alto grau de analfabetos; relação de dependência com atravessadores em suas compras e vendas; apática prática associativista; rendas baixas e instáveis sempre, à maioria; e ora pelo dificílimo acesso aos benefícios gerados pelos tributos, inclusive por serem grandes contribuintes individuais – a carga tributária sobre a renda familiar de até dois salários mínimos é de 54%, e acima de 30 salários é de 29% [IPEA].
Ao agricultor, à Lei da Agricultura Familiar [Lei 11.326] e à Lei da Ater [Lei 12.188] para acessar dos benefícios da inovação tecnológica e organizacional à seguridade social; confirmar critérios e graus de exigência para que a exploração de atividade produtiva cumpra sua função social [Art.186 da Constituição Federal]; exercitar a cidadania igual participando de decisões, que diz respeito a sua posição na distribuição dos bens primários: liberdade, riqueza, renda, inteligência, autorrespeito e outros; assegurar o serviço estatal de pesquisa e extensão rural com qualidade [via empresa pública de direito privado]; e assim, sustentar à lógica familiar: terra, trabalho e família, ao conquistar posições sociais confortáveis, ora pelo uso e controle dos recursos naturais e dos tributos.
Para avançar nessas posições, necessário se faz que a academia, o governo, os ricos, e ele, o rurícola, o agricultor, o extrativista familiar e o trabalhador de aluguel, sejam ousados para discutirem essa pauta e implementá-la: planejando, formulando, executando, avaliando as políticas públicas, e corrigindo aquelas que atendem ao clientelismo político e ao seu conformismo. Assim, é preciso reformar as mentes e os corações na perspectiva de que a distribuição desigual da riqueza privada, da riqueza pública e de outras prerrogativas são toleráveis se ela contribuir para melhorar-lhes à vida.
Em Alagoas, 60% dos 03 milhões de pessoas são pobres – ganhos até ½ salário mínimo per capita domiciliar [IPEA] –, inclusive catando lixo e ou vivendo do trabalho e prostituição infanto-juvenil. É um Estado que necessita abrir-se ao diálogo; precisa de sua gente para avançar na dialética em assuntos caros a sua existência e a sua essência: ocupações e rendas decentes e legais; planejamento familiar, saúde, educação, segurança pública e alimentar com qualidade; moradia e lazer salubres; e patrimônio imaterial salvaguardado.
Aliás: “todo indivíduo nasce com um legítimo direito a uma certa forma de propriedade ou seu equivalente”[Thomas Paine,1795] da riqueza econômica, ecológica e cultural gerada e a ser gerada em ambiente de cooperação social e democrático, crie e assegure-o em seu lugar de origem, vida digna, pelo exercício de sua liberdade individual, principalmente na esfera pública.
Artigo publicado pela: Tribuna Independente, Maceió – Alagoas, 2010.
Me acostumei a ler o artigo, semanal, deste blog. Continue neste empreitada. Rita.
ResponderExcluirSó com uma educação de qualidade, pode-se avançar no exercício da cidadania e na distribuição da riqueza.É um artigo elucidativo, Renan.
ResponderExcluirO texto me leva a uma reflexão: Por que não enxergamos que o alto imposto (54%) sobre a renda dos agricultores familiares, em especial,que ganham até 02 salários é um dos elementos fortes responsáveis por sua situação caótica. Arnaldo.
ResponderExcluirContinuo lendo os ótimos textos e repassando o endereço deste blog aos amigos, Eduardo.
ResponderExcluirParabéns pelos artigos, Everaldo.
ResponderExcluirA citação: “lucro é o que pode consumir durante uma semana e sentir-se tão bem no final como se sentia no início”, sinaliza como estamos distante da real necessidade do agricultor familiar. Álvaro
ResponderExcluirA frase de Paine,1795, retrata que não houve evolução de sua proposta. Ricardo
ResponderExcluirFico com a observação do comentarista acima. Ronaldo
ResponderExcluirExcelente. Rosa
ResponderExcluirLi e gostei. Ivanildo
ResponderExcluirAltos impostos para serviços tão ruins, reflete a necessidade de exercitar a cidadania por parte dos agricultores e pescadores familiares. Dema
ResponderExcluirExcelente texto. Sebastião
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