domingo, 24 de fevereiro de 2013

ACORDAM para o bem-estar

Marcos Antonio Dantas de Oliveira

As mulheres, Maria e Tânia, entre tantas participantes do 1º Encontro Nacional do Movimento de Mulheres Camponesas do Brasil (Brasília, 18 de fevereiro)  comentaram [1]: "A terra por si só não serve, porque precisamos de uma infraestrutura que é estrada, energia, água, saúde pública", comenta Maria Cavalcante  [assentamento da Reforma Agrária em Alagoas].

Enquanto a ribeirinha Tânia Chantel, do Amazonas, "destaca a importância da reforma agrária e da garantia da titulação da terra para dar segurança a quem retira dela o sustento".

“É perfeitamente possível que as mulheres tenham descoberto pelo menos um dos dois fundamentos que, há 10 mil anos, deram início à completa transformação da economia do homem – a agricultura, o processo deliberado de semear, cuidar, proteger e colher culturas específicas, domesticando-as através da seleção natural das que melhor atendiam às necessidades do homem” (JAY, A riqueza do homem, 2000).

Ainda assim, “Mulheres ganham 76% do salário pago aos homens” [2], muitas sem renda.

“Mulheres são a maioria entre jovens fora da escola e do mercado de trabalho” [3].

Esses fatos geram situações em que as mulheres, em maioria, ainda não são protagonistas na esfera pública [cidadãs e livres], e na esfera privada [dos desejos materiais e vaidades] do processo ecológico e social; e nesse sentido, ainda não conseguem deslocar-se para melhorar suas vidas, principalmente as campesinas - as agricultoras estão em posição desfavorável no uso e acesso de ativos como terra, gado, maquinário, insumos, serviços de crédito agrícola, extensão de conhecimentos técnicos e capacitação, segundo a FAO (Estado Mundial da Agricultura e da Alimentação 2011).

O Banco Mundial "apontou que as mulheres têm mais probabilidades de ter um trabalho não remunerado do que os homens, além de maior chance de trabalhar em terrenos menores e em cultivos menos lucrativos e de dirigir empresas menores e setores com menos remuneração" [4].

Como reformar o ambiente social rural se a remuneração da agricultora é pequena e instável, muito menor do que um salário mínimo? No Brasil, a agricultura remunera com até um salário mínimo, os estabelecimentos com área inferior a 50 ha; no Nordeste, são 94% com área inferior a 100 ha e geram até um salário mínimo (ALVES et al., 2006); e mais precária e instável em Alagoas, 82% deles têm até 10 ha.

Por que a jornada ampliada das mulheres para cuidar dos afazeres domésticos, da labuta na lavoura e na criação, de doméstica em lares de terceiros [emprego em baixa, mas pela escassez há valorização da remuneração], e principalmente em cuidar da família [numa rotina de 14 horas diária]; e que muitas vezes esquece de si mesma. Que tal a sociedade e o estado entenderem sua importância e lhes dar direito a receber uma renda não produtiva, como política pública de bem-estar. Que tal Renda da Cidadania?

Desta forma, tornam-se mais dependentes do clientelismo, de viés autoritário e patrimonialista no arranjo e no ambiente institucional brasileiro; no que reforça DaMatta, em Carnavais, Malandros e Heróis: “Cada qual busca sempre estar no lugar social adequado, o que significa que o princípio da hierarquia é sempre aplicado, pois o maior temor social no Brasil é o estar fora de lugar, estar deslocado”.

Assim, as lógicas familiares: terra e água, trabalho, e família das agricultoras, extrativistas, povos e comunidades tradicionais suas famílias e outros rurícolas são afetados pela satisfação consumista que exige dessas categorias a compra de produtos que não querem com o dinheiro que não têm; todos ao crédito da usura [ora pelo cartão de crédito, pelo carnê, pelo crédito pessoal e consignado, e outras formas de transferir rendas, inclusive pela utilização do trabalho infanto-juvenil de seus filhos].

Além disso, transferem suas mais-valias, suas precárias e instáveis rendas aos setores econômicos: industrial, comercial, financeiro [e ao estatal], bem como aos consumidores de seus produtos e serviços, aumentando a desigualdade [no mundo do ter], anulando a igualdade política [no mundo do estar] e privando-os das liberdades [no mundo do ser]. Na economia não existe almoço grátis, afirma Milton Friedman [Prêmio Nobel de Economia].

A partir dessa desestrutura, aniquila-se a cooperação, a diversidade e a interdependência, elementos vitais do discurso e prática libertadora, porque o governo desestimula a participação política em decisões que envolvem escolhas de benefícios e encargos da cooperação social, e a potencialização de ações para o bem-estar com todos, pela baixa participação dessas categorias na esfera pública.

Agricultora e extrativista familiares, a dialética, a cidadania igual e a liberdade individual são motores que tornam realidade os artigos da Constituição Federal; sobretudo por operar, avaliar e corrigir as políticas públicas distributivas, redistributivas e reguladoras, e nesse sentido, manter a lógica familiar sustentável: econômica, social, ecológica, política e patrimonial em seus lugares de origem, aprendendo a ser e a viver junto com vida digna.

Por isso, "não se esqueçam das mulheres no novo contexto legislativo, caso contrário elas também se rebelarão", redigia Abigail Adams a seu marido John Adams em 1776 [futuro presidente dos Estados Unidos da América].

Então, quem faz a história: a agricultora Rainha do lar, o marido agricultor Plebeu, a Rica rainha do lar, o Capitalista marido plebeu?




[1]   www.ecodebate.com.br/2013/02/19/mulheres-camponesas-discutm-violencia-e-geração=de-renda-em-encontro-em-brasilia/
[2]   Dieese (noticias.bol.uol.com.br/2011/mar/02)
[3]   Alagoas em Tempo, 07-13/fev/2011
[4]  tribunahoje.com, 21/set/2011

11 comentários:

  1. Parabéns mulheres pelo encontro. lúcia

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  2. Importante frisar o trabalho não remunerado das mulheres,um caos na vida familiar. oto

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  3. A reforma agrária continua importante para essas famílias. Toninho

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  4. O que chama atenção é a jornada ampliada, que para o estado e a sociedade continua invisível. Vanessa

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  5. Caro Marcos
    Presente no Primeiro Encontro do Movimento das Mulheres Camponesas, além da vibração e o grito de mudança do movimento, tb as palavras da presidente Dilma que até lembrou do cooperativismo.
    Kleber.

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  6. É a jornada ampliada um desgaste e tanto para as mulheres. Paula

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  7. Parabéns pelo texto. Vera

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  8. Nós também temos algumas Abigail. Gabi

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  9. Texto e comentários oportunos. Paulo

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  10. A jornada ampliada, em geral não remunerada, é um dos desafios dessas mulheres. Davi

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