sábado, 14 de agosto de 2010

Vida de trabalho e penosidade

Marcos Antonio Dantas de Oliveira

Absorve a compreensão de envolver, desdobrar, cultivar, preservar, distribuir e comunicar-se com a unidade e a diversidade, ora nas relações consigo, com os homens e com o mundo. Contudo, é um enfrentamento dramático, pois é um processo ora natural e ou artificial, ora inacabado ou inacabável, ora de desencantamento – “Hábitos das classes A e B devastam o meio ambiente’, noticia a Tribuna Independente em 2008; ora de encantamento – “Era um final de tarde, destes belos dias da primavera. Numa casa de madeira, com janelas também de madeira toda a família observava os encantos da natureza; uma chuva mansa se misturava com os últimos raios do sol, formando um inesquecível arco-íris. Por que será que as pessoas não vão mais as janelas?”, comenta Diogo Guerra em Crônicas de uma vida nem tão anunciada.

Dito isso, exige-se para o debate: argumentos, mediações e compromissos, estratégias e responsabilidades sobre idéias e experiências do citadino e rurícola, da sociedade e estado. Assim, é possível construir rituais e ritos de passagem, que devem ter [e ser] uma dimensão virtuosa tal qual foi à invenção da agricultura e da revolução industrial para as sociedades daquelas épocas, ora confirmando ora alterando seus estilos de vida.

E o desenvolvimento rural sustentável como processo multidimensional e multifuncional é dialético: requer envolvimento, rupturas, limitações, diálogos, procedimentos, ordenamentos. É a regulamentação política o instrumento de compromisso e de controle social deste processo: social, econômico, patrimonial e ecológico capaz de traçar os princípios de justiça como equidade, com base na cidadania igual e na posição original do indivíduo na sociedade, que adotada por todos sem qualquer distinção melhora a vida, essencialmente no presente, dos que moram no campo – comerciantes e comerciários, trabalhadores de aluguel, agricultores, extrativistas e pescadores e suas famílias [... quilombolas, caboclos e índios] –, bem como assegura-lhes autonomia na escolha de seus planos de vida espiritual.

E não mais o modo de produção dominante [tudo à venda], que depois de ter destruído o campesinato e boa parte dos artesãos urbanos; apelado para o exército de reserva de trabalhadores e imigrantes; criado a pobreza e o êxodo rural, e grandes aglomerações citadinas, dentro delas, as favelas ora desumanas e inadministráveis; desertificado regiões inteiras; e ainda marginaliza milhões de trabalhadores, inclusive crianças e adolescentes ao sobretrabalho, subemprego e ao desemprego.

Sobretudo, esse sistema no seu dia a dia gera e distribui muita riqueza e renda para uns poucos; no entanto, junto com o estado, ainda são incapazes de asseverar a existência de condições de vida digna para a grande maioria das pessoas. E, mais vulneráveis, estão os habitantes rurais face à precariedade da renda, da moradia, da alimentação, do lazer aos serviços essenciais, ora por políticas públicas autoritárias e clientelistas que solapam seus interesses; ora pela relação mal resolvida entre o rurícola e o citadino, agravando suas relações familiares, de amizade, de trabalho e facilmente as culturais como torna relevante o caráter tirânico da informação, da mídia, do dinheiro, da corrupção e do sabe com está falando.

Para diminuir esse processo de mercadorização crescente [tudo à venda]: dos recursos e serviços naturais às pessoas; as gerações presentes e futuras [famílias, empresas, governos, escolas, movimentos sociais e ecológicos] devem alfabetizar-se nos princípios ecológicos [interdependência, diversidade, reclicagem, cooperação, flexibilidade] em proveito de estilos de vida interdependentes e salutares. São reais, esses princípios nas sociedades: autóctone e tradicional, nelas inexistem a troca desigual econômica e ecológica.

Aliás, a pesquisa agropecuária e a extensão rural baseadas nesses princípios são ferramentas para construir tipos de desenvolvimento rural sustentável; por ajudar a descentralizar decisões e a institucionalizar a democracia nos diversos territórios; enfim, auxiliam os agricultores, os extrativistas, os pescadores, os trabalhadores de aluguel, os rurícolas e familiares superarem a separação de funções e tarefas típicas da sociedade industrial: padrão, hierarquização, massificação, experts, machos alfa.

Convém, indagar e corrigir atitudes, práticas e políticas: do uso, conservação e preservação dos potenciais ecológicos ao patrimônio imaterial – “A lagoa está cheia de lixo. Não tem mais lama no fundo da lagoa para que o sururu possa se reproduzir”, diz Maria Cícera {O Jornal, jul. 2010}; do sentimento de pertencimento ao projeto pedagógico de educação à vida digna – “Aqui já fizemos um monte de coisas, criatório de galinhas caipira, carneiro, porco, mas algumas coisas não deram certo, o problema é o escoamento da produção”, afirma Vavá, que nasceu no Serrotinho [Ouro Branco/AL] e nunca pensou em sair de lá”. “O que falta é assistência técnica e políticas públicas para evitar o êxodo rural”, emenda Joeci {Gazeta de Alagoas, jan, 2010}; e por fim, o direito inalienável dos rurícolas: à liberdade individual para escolher e sustentar seus estilos de vida, também pelo acúmulo de riqueza privada e maior acesso à riqueza pública.



Artigo Publicado pelo jornal:Tribuna Independente, Maceió - Alagoas, 2010

12 comentários:

  1. É um artigo consistente ao falar da vida rural: problemas e soluções, mas acima de tudo, é vibrante, Pedro

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  2. Ao agricultor e ao pescador familiar falta-lhes entender que os avanços na melhoria de suas vidas passam necessariamente pelo acúmulo de riqueza privada e maior acesso à riqueza pública, como escreve o autor. Parabéns pelo oportuno texto, Edgar.

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  3. Li os dois últimos artigos, achei os recados interessantes e oportunos, Lúcia

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  4. Acumular riqueza privada e ter maior acesso à riqueza pública exigem do agricultor familiar como do técnico discernimento sobre quem controla os recursos naturais e os impostos. Assim também entendo, Artur.

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  5. Um artigo primoroso, Rita.

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  6. Marcos seus textos me deixa com vontade de lutar ainda mais pela melhoria de vida dos agricultores, Lúcia

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  7. Bons artigos, Valdemar.

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  8. Para melhorar a qualidade de vida no campo. Vou repetir a frase de Joeci: "O que falta é assistência técnica e políticas públicas para evitar o êxodo rural”. Bruno

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  9. Um texto oportuno, pois reflete a condição de vida dos agricultores familiares, Leandro

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  10. As falas da Maria Cícera, da Joeci e do Vavá retratam bem como vivem e o que querem. É um texto de muita sensibilidade,parabéns. Nilton

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  11. Há vida lá fora revela à escuridão em que vive o primo pobre, o rurícola. Ademar

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  12. Os comentários deixam claro quanto o tema é importante, e eu concordo com eles. Rui

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